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sábado, 15 de agosto de 2009

Capítulo 4 - Visões

4. Visões

Eu voltei para a escola. Era a coisa certa a fazer, a maneira mais discreta de me comportar.
No final do dia, quase todos os outros alunos também tinham voltado para as aulas. Só o Tyler e Bella e alguns outros, que provavelmente estavam a usar o acidente como uma oportunidade para se baldarem às aulas, continuavam ausentes.
Não devia ser tão difícil para mim fazer a coisa certa. Mas, durante toda a tarde, estive a ranger os dentes contra o desejo que me deixava a querer baldar-me à aula também, ir procurar a rapariga outra vez.
Como um perseguidor. Um perseguidor obsessivo. Um vampiro perseguidor obsessivo.
A escola hoje estava, de alguma forma, impossivelmente ainda mais aborrecida do que tinha sido há uma semana. Aborrecimento de coma. Era como se as cores tivessem sido drenadas das paredes de tijolos, das árvores, do céu, das caras à minha volta.
Havia outra coisa certa que eu devia estar a fazer… e não estava. Claro, também era uma coisa errada. Tudo dependia da perspectiva de quem olhava.
Da perspectiva de um Cullen, não simplesmente um vampiro, mas um Cullen, alguém que pertencia a uma família, uma coisa tão rara no nosso mundo, a coisa certa a fazer-se seria algo assim:
- Estou surpreendido por te ver na aula, Edward. Eu ouvi dizer que estiveste envolvido naquele acidente horrível hoje de manhã.
- Sim, estive, Sr. Banner, mas eu fui o sortudo. - Um sorriso amigável. - Eu não me magoei de todo… gostaria de poder dizer o mesmo do Tyler e Bella.
- Como é que eles estão?
- Eu acho que o Tyler está bem… só alguns arranhões superficiais do vidro do pára-brisas. Embora não tenha a certeza quanto a Bella. - Uma cara preocupada. - Ela pode ter uma concussão. Ouvi dizer que ela esteve bastante incoerente por algum tempo, até viu coisas. Sei que os médicos estavam preocupados…

Era assim que deveria ter sido. Era aquilo que eu devia à minha família.
- Estou surpreendido por te ver na aula, Edward. Eu ouvi dizer que estiveste envolvido naquele acidente horrível hoje de manhã.
- Não me magoei. - Sem sorriso.
O Sr. Banner mudou o seu peso de um pé para o outro, desconfortável.
- Tens alguma ideia de como é que o Tyler Crowley e a Bella Swan estão? Ouvi dizer que tiveram alguns ferimentos…
Encolhi os ombros. – Não tenho como saber isso.
O Sr. Banner limpou a garganta. - Ah, certo… - Disse, enquanto o meu olhar frio deixava a voz dele um pouco tensa.
Ele andou rapidamente para a frente da sala e começou a matéria.
Era a coisa errada a fazer-se. A não ser que se olhasse de uma perspectiva mais obscura.
Só que parecia tão… tão deselegante caluniar a rapariga pelas costas, especialmente quando ela estava a provar que podia confiar nela mais do que eu podia ter sonhado. Ela não tinha dito nada para me trair, embora tivesse uma boa razão para o fazer. Eu ia traí-la quando ela não tinha feito nada a não ser guardar o meu segredo?
Tive uma conversa quase idêntica com a Sra. Goff, só que em espanhol em vez de inglês. E Emmett olhou para mim durante um longo tempo.
Espero que tenhas uma boa explicação para o que aconteceu hoje. A Rose está em pé de guerra.
Revirei os olhos sem olhar para ele.
Na verdade eu tinha criado uma explicação que parecia perfeita. Vamos supor que eu não tinha feito nada para parar a carrinha antes que ela esmagasse a rapariga… tremi com esse pensamento. Mas se ela tivesse sido atingida, se ela tivesse sido ferida e tivesse sangrado, o fluído vermelho derramado, desperdiçado no asfalto, o cheiro de sangue fresco a pulsar no ar…
Tremi de novo, mas não apenas em horror. Uma parte de mim tremeu de desejo. Não, eu não teria sido capaz de a ver sangrar sem nos expor a todos numa maneira muito mais escandalosa e chocante.
Parecia a desculpa perfeita… mas eu não a ia usar. Era vergonhosa de mais.
E eu nem sequer tinha pensado nela até um pouco depois de o facto ter ocorrido.
Cuidado com o Jasper. Continuou Emmett , alheio aos meus pensamentos. Ele não está tão nervoso… mas está mais decidido.
Eu vi o que ele quis dizer, e por um momento a sala girou à minha volta. O meu ódio era tão devorador que uma névoa vermelha encobriu a minha visão. Eu pensei que me fosse engasgar nela.
CREDO, EDWARD! CONTROLA-TE! O Emmett gritou-me na sua cabeça. A mão dele desceu para o meu ombro, segurando-me no meu lugar antes que eu pudesse saltar e ficar de pé. Ele raramente usava a sua força completa - raramente havia necessidade, porque ele era muito mais forte que qualquer outro vampiro que qualquer um de nós já tivesse encontrado - mas usou-a agora. Agarrou o meu braço, em vez de me empurrar para baixo. Se ele me estivesse a empurrar, a cadeira debaixo de mim ter-se-ia desmoronado.
CALMA! Ordenou-me.
Eu tentei acalmar-me, mas era difícil. A fúria queimava na minha cabeça.
O Jasper não vai fazer nada até que nós conversemos todos. Só achei que devias saber a direcção que ele está a tomar.
Concentrei-me em relaxar, e senti a mão do Emmett a libertar-me.
Tenta não chamares mais à atenção. Já estás com problemas suficientes da maneira que as coisas estão.
Eu respirei fundo e o Emmett soltou-me.
Procurei à volta da sala várias vezes, mas o nosso confronto tinha sido tão curto e silencioso que só algumas pessoas sentadas atrás de Emmett tinham notado. Nenhuma delas sabia o que pensar daquilo, portanto esqueceram. Os Cullens eram aberrações – já todos sabiam disso.
Raios, miúdo, estás horrível. - O Emmett acrescentou, com o seu tom simpático.
- Vai-te lixar. - Resmunguei entre dentes, e ouvi o riso baixo dele.
O Emmett não guardava rancor, e eu provavelmente devia-lhe estar agradecido pela sua natureza de fácil convívio. Mas eu conseguia ver que as intenções de Jasper faziam sentido para Emmett, que ele estava a considerar qual seria o melhor caminho a tomar.
O ódio ferveu, quase fora de controlo. Sim, o Emmett era mais forte do que eu, mas ele ainda não me tinha ganho numa luta. Ele dizia que era porque eu fazia batota, mas ouvir pensamentos era tão parte de mim como a força era dele. Nós lutávamos de igual para igual.
Uma luta? Era essa a direcção que tudo isto estava a tomar? Ia lutar contra a minha família por uma humana que mal conhecia?
Pensei sobre isso por um minuto, pensei na sensação do frágil corpo da rapariga nos meus braços contra Jasper, Rose e Emmett, sobrenaturalmente fortes e rápidos, máquinas de matar por natureza…
Sim, eu ia lutar por ela. Contra a minha família. E tremi.
Mas não era justo deixá-la desprotegida quando fui eu quem a colocou em perigo.
Mas eu não ia conseguir ganhar sozinho, não contra eles os três, e perguntei-me quais seriam os meus aliados.
Carlisle, certamente. Ele não iria lutar contra ninguém, mas ia ser contra os planos de Rose e Jasper. Talvez isso fosse tudo o que eu precisasse. Ia ver…
Esme, duvido. Ela também não iria ficar contra mim, e ela iria detestar discordar de Carlisle, mas ia ser a favor de qualquer plano que mantivesse a sua família unida. A sua prioridade não eram as regras, mas sim eu. Se Carlisle era a alma da família, Esme era o coração. Ele deu-nos um líder que merecia ser acompanhado, ela transformou isso num acto de amor. Todos nós nos amávamos, mesmo por baixo da fúria que eu sentia por Jasper e Rose neste momento, mesmo a planear lutar contra eles para salvar a rapariga, eu sabia que os amava.
Alice… não fazia ideia. Provavelmente ia depender do que ela visse que estava a chegar. Ela ficaria do lado do vencedor, imaginei.
Então eu tinha que fazer isto sem ajuda. Sozinho, eu não era um grande desafio para eles, mas eu não ia deixar que a rapariga fosse magoada por minha culpa. Isto talvez exigisse uma acção evasiva…
A minha raiva diminuiu um pouco com o súbito humor negro. Conseguia imaginar como é que ela iria reagir se eu a raptasse. É claro, eu raramente adivinhava as suas reacções, mas que outra reacção é que ela poderia ter além de terror?
Mas não tinha bem a certeza de como lidar com aquilo - raptá-la. Não seria capaz de ficar perto dela por muito tempo. Talvez eu só a devolvesse à mãe. Mesmo isso seria repleto de perigo. Para ela.
E também para mim, percebi de repente. Se eu a matasse por acidente… eu não tinha a certeza de quanta dor é que isso me iria causar, mas sabia que seria intensa e em várias formas.
O tempo passou rapidamente enquanto meditava sobre todas as complicações à minha frente: a discussão que me esperava em casa, o conflito com a minha família, a distância que eu seria forçado a percorrer depois de tudo…
Bem, eu já não me podia queixar que a vida fora da escola era monótona. A rapariga tinha mudado isso.
O Emmett e eu andámos silenciosamente para o carro quando a campainha tocou. Ele estava preocupado comigo, e preocupado com Rosalie. Ele sabia que lado teria que escolher numa disputa, e isso incomodava-o.
Os outros estavam à nossa espera no carro, também silenciosos. Éramos um grupo bastante quieto. Só eu conseguia ouvir a gritaria.
Idiota! Lunático! Imbecil! Estúpido! Egoísta, tolo irresponsável! A Rosalie mantinha uma linha constante de insultos a plenos pulmões. Tornou-se difícil ouvir os outros, mas eu ignorei-a o melhor que eu pude.
O Emmett tinha razão quanto a Jasper. Ele estava seguro do seu plano.
A Alice estava transtornada, preocupada com Jasper, passando por imagens do futuro. Não importava por qual direcção o Jasper chegava à rapariga, a Alice via-me sempre lá, a impedi-lo. Interessante… nem Rosalie ou Emmett estavam com ele nessas visões. Então Jasper planeava trabalhar sozinho. Isso ia deixar as coisas equilibradas.
Jasper era o melhor lutador, certamente o mais experiente entre nós: a minha única vantagem consistia no facto de que eu podia ouvir os seus movimentos antes que ele os fizesse.
Eu nunca tinha lutado mais do que por brincadeira com o Emmett ou Jasper - só como passatempo. Senti-me enjoado com o pensamento de tentar realmente magoar o Jasper…
Não, isso não. Só impedi-lo. Isso era tudo.
Eu concentrei-me na Alice, memorizando as diferentes formas de ataque de Jasper.
Quando fiz isso, as visões dela mudaram, afastando-se mais e mais da casa dos Swan. Eu estava a impedi-lo antes…
Pára com isso Edward! Não pode acontecer dessa maneira. Eu não vou deixar. Eu não respondi, só continuei a ver.
Ela começou a olhar mais para a frente, para o campo nebulado e incerto de possibilidades distantes. Era tudo sombrio e vago.
No caminho inteiro para casa, a atmosfera silenciosa não cedeu. Estacionei na grande garagem perto de casa; o Mercedes de Carlisle estava ali, perto do Jipe enorme de Emmett, o M3 de Rosalie e meu Vanquish. Fiquei contente por Carlisle já estar em casa - o silêncio ia terminar de forma explosiva, e eu queria que ele estivesse por perto quando isso acontecesse.
Fomos directos para a sala de jantar.
A sala nunca era, é claro, usada para o propósito para o qual fora construída. Mas era mobilada com uma longa mesa oval de mogno cercada por cadeiras - éramos cuidadosos em ter os acessórios para fingir. O Carlisle gostava de usá-la como uma sala de conferência. Num grupo com tantas personalidades fortes e distintas, às vezes era necessário discutir as coisas sentados, de uma forma calma.
Eu tinha um pressentimento de que sentar não iria ajudar em muita coisa hoje.
O Carlisle sentou-se no lugar habitual na ponta leste da mesa. A Esme estava ao lado dele - deram as mãos em cima da mesa.
Os olhos de Esme estavam em mim, as profundezas douradas deles, cheias de preocupação.
Fica. Foi o seu único pensamento.
Eu queria conseguir sorrir para a mulher que era verdadeiramente uma mãe para mim, mas eu não tinha como assegurá-la disso agora.
Sentei-me do outro lado de Carlisle. A Esme virou-se à volta dele para colocar a sua mão livre no meu ombro. Ela não fazia ideia do que estava prestes a começar, só estava preocupada comigo.
O Carlisle tinha uma noção melhor do que estava a chegar. Os seus lábios estavam apertados com força e a testa estava enrugada. A expressão era muito velha para o rosto jovem dele.
Quando todos os outros estavam sentados, eu consegui ver as linhas a serem desenhadas.
A Rosalie sentou-se directamente à frente de Carlisle, na outra ponta da grande mesa. Ela olhou-me fixamente, nunca desviando o olhar.
O Emmett sentou-se ao lado dela, com o seu rosto e mente amargos.
O Jasper hesitou, então ficou de pé contra a parede atrás de Rosalie. Ele estava decidido, não importava o resultado desta discussão. Os meus dentes rangeram-se.
A Alice foi a última chegar, e os seus olhos estavam concentrados nalguma coisa muito longe - o futuro, ainda muito incerto para que ela fizesse uso dele. Sem parecer pensar ela sentou-se perto de Esme. Ela esfregou a testa como se tivesse uma dor de cabeça. O Jasper contorceu-se com preocupado e considerou juntar-se a ela, mas manteve a sua posição.
Respirei fundo. Eu tinha começado isto, devia falar primeiro.
- Desculpem. - Disse, a olhar primeiro para Rosalie, depois para Jasper e então Emmett. - Eu não tive nenhuma intenção de colocar nenhum de vocês em perigo. Não pensei, e eu assumo a responsabilidade total pelo meu acto precipitado.
Rosalie olhou para mim malignamente. - O que é que queres dizer, ‘assumes a responsabilidade’? Vais consertar isto?
- Não da maneira que tu queres dizer. - Disse, a tentar manter a minha voz calma e equilibrada. - Estou disposto a ir embora agora, se isso deixar as coisas melhores. - Se eu acreditar que a rapariga ficará segura, se eu acreditar que nenhum de vocês irá tocá-la, emendei na minha cabeça.
- Não. - Esme murmurou. - Não, Edward.
Toquei-lhe na mão. - São só alguns anos.
- A Esme tem razão. - O Emmett disse. - Tu não podes ir para lugar nenhum agora. Isso seria o oposto de útil. Nós temos que saber o que as pessoas estão a pensar agora mais do que nunca.
- A Alice vai apanhar o que houver de grave. - Discordei.
O Carlisle abanou a cabeça. - Eu acho que o Emmett tem razão, Edward. Vai ser mais fácil a rapariga falar se tu desapareceres. Ou vamos todos, ou ninguém vai.
- Ela não vai dizer nada. - Insisti rapidamente. A Rose estava a construir uma explosão, e eu queria deixar aquele facto claro.
- Tu não conheces a mente dela. - O Carlisle lembrou-me.
- Disso eu tenho a certeza. Alice, dá-me uma ajudinha.
Alice olhou para mim com um ar zangado. - Eu não consigo ver o que vai acontecer se nós ignorarmos isto. - Olhou de relance para Rose e Jasper.
Não, ela não conseguia ver esse futuro, não quando a Rosalie e o Jasper estavam tão decididos em não ignorar o acidente.
A palma da Rosalie bateu na mesa com um barulho alto. - Não podemos permitir que a humana tenha oportunidade de dizer alguma coisa. Carlisle, tens de ver isso. Mesmo se decidirmos todos desaparecer, não é seguro deixar histórias para trás. Nós vivemos de uma maneira tão diferente do resto da nossa espécie - tu sabes que existe quem iria adorar uma desculpa para fazer acusações. Temos que ter mais cuidado do que qualquer um!
- Já deixámos rumores para trás antes. – Lembrei-a.
- Só rumores e suspeitas, Edward. Não testemunhas oculares e provas!
- Provas! - Gozei.
Mas o Jasper estava a concordar, os seus olhos estavam duros.
- Rose… - O Carlisle começou.
- Deixa-me terminar, Carlisle. Não precisa ser uma grande produção. A rapariga bateu com a cabeça hoje. Então talvez o ferimento acabe por ficar mais sério do que parecia. - A Rosalie encolheu os ombros. – Todos os mortais vão dormir com a hipótese de nunca mais acordar. Os outros iam ficar à espera que cuidássemos nós mesmos disso. Tecnicamente, esse seria o trabalho do Edward, mas isto está obviamente além dele. Tu sabes que eu me consigo controlar. Eu não iria deixar nenhuma prova para trás.
- Sim, Rosalie, nós todos sabemos a assassina eficiente que és. - Rosnei.
Ela soltou um silvo, furiosa.
- Edward, por favor. - O Carlisle disse. E depois virou-se para a Rosalie. - Rosalie, eu apoiei-te em Rochester porque senti que tinhas direito a ter justiça. Os homens que mataste tinham-te magoado monstruosamente. Esta não é a mesma situação. A rapariga Swan é uma inocente.
- Não é nada pessoal, Carlisle. - Rosalie disse entre dentes. - É para nos proteger a todos.
Houve um breve silêncio enquanto Carlisle pensava na sua resposta. Quando ele acenou a cabeça, os olhos de Rosalie brilharam. Ela devia saber melhor que aquilo. Mesmo se eu não fosse capaz de ler os pensamentos dele, eu podia ter previsto as suas próximas palavras. Carlisle nunca cedia.
- Eu sei que a tua intenção é boa, Rosalie, mas… Eu gostaria muito que a nossa família fosse digna de ser protegida. Os ocasionais… acidentes ou lapsos de controlo são uma parte lamentável de quem nós somos. - Era bastante comum ele incluir-se no plural, embora ele próprio nunca tivesse tido aquele tipo de lapso. - Assassinar uma criança sem culpa a sangue frio é outra coisa completamente diferente. Eu acredito que o risco que ela apresenta, quer ela diga alguma coisa das suas suspeitas ou não, não é nada muito grave. Se abrirmos excepções para nos protegermos, estaremos a arriscar algo muito mais importante. Nós arriscamos perder a essência de quem somos.
Controlei a minha expressão com cuidado. Não ia fazer bem nenhum sorrir agora. Ou aplaudir, como eu gostava.
A Rosalie fez uma cara zangada. - É só ser responsável.
- É ser insensível. - O Carlisle corrigiu gentilmente. – Todas as vidas são preciosas.
Rosalie suspirou pesadamente e seu lábio inferior fez um bico. Emmett bateu-lhe no ombro. - Vai ficar tudo bem, Rosalie. – Encorajou-a com uma voz baixa.
- A questão - O Carlisle continuou. - É se nos devemos mudar ou não?
- Não. - A Rosalie lamentou-se. - Acabámos de assentar. Não quero começar o segundo ano do liceu outra vez!
- Podias manter a tua idade actual, claro. - Disse Carlisle.
- E ter que me mudar ainda mais cedo?
O Carlisle encolheu ombros.
- Eu gosto disto daqui! Tem pouco sol, podemos quase ser normais.
- Bem, não precisamos de decidir agora. Podemos esperar e ver se isso se torna necessário. O Edward confia no silêncio da rapariga Swan.
A Rosalie bufou.
Mas eu já não estava preocupado com Rosalie. Conseguia ver que ela ia concordar com a decisão de Carlisle, independentemente do quanto estivesse furiosa comigo. A conversa deles tinha-se voltado para detalhes sem importância.
O Jasper continuou determinado.
Eu entendi o motivo. Antes dele e a Alice se conhecerem, ele vivia numa zona de combate, um cenário de guerra impiedoso. Ele sabia as consequências de desprezar as regras, já tinha visto os medonhos resultados com os meus próprios olhos.
Dizia muita coisa o facto de ele não ter tentando acalmar a Rosalie com seus talentos extras, ou porque não a incentivava. Ele mantinha-se neutro na discussão - acima dela.
- Jasper. – Disse-lhe.
Ele encontrou o meu olhar, o rosto dele não tinha expressão.
- Ela não vai pagar pelo meu erro. Eu não vou permitir isso.
- Vai beneficiar-se dele então? Ela devia ter morrido hoje, Edward. Eu só iria consertar as coisas.
Repeti, enfatizando cada palavra. - Eu não vou permitir.
Ele ergueu as sobrancelhas. Ele não estava à espera disto, não imaginava que eu fosse impedi-lo.
Ele abanou a cabeça uma vez. - Não vou deixar a Alice viver em perigo, mesmo que seja ligeiro. Tu não sentes por ninguém o que eu sinto por ela, Edward, e tu não viveste o que eu vivi, quer tenhas visto as minhas memórias ou não. Tu não entendes.
- Não estou a discutir isso, Jasper. Mas estou a avisar-te, não vou deixar-te magoar a Isabella Swan.
Olhámos um para o outro, não a fixar, mas sim a avaliar o oponente. Senti-o a verificar o ambiente à minha volta, testando a minha determinação.
- Jazz… - A Alice disse, interrompendo-nos.
Ele aguentou o seu olhar mais um bocado, e depois olhou para ela. - Não te incomodes a dizer-me que te consegues proteger sozinha, Alice. Eu já sei disso. Ainda assim eu tenho que…
- Não é isso que eu vou dizer. - Alice interrompeu. - Eu ia-te pedir um favor.
Vi o que estava na mente dela e a minha boca abriu-se com um choque audível. Olhei para ela, chocado, só vagamente consciente de que todos tirando a Alice e Jasper me observavam cuidadosamente.
- Eu sei que me amas. Obrigada. Mas eu gostava muito que não tentasses matar a Bella. Primeiro de tudo, o Edward está a falar a sério e eu não quero que vocês os dois lutem. Segundo, ela é minha amiga. Pelo menos, vai ser.
Estava nítido como vidro na mente dela: A Alice, a sorrir, com os seus braços gelados à volta dos ombros quentes e frágeis da rapariga. E Bella estava a sorrir também, o braço dela na cintura de Alice.
A visão era sólida como uma pedra; só o tempo é que era incerto.
- Mas, Alice… - O Jasper ofegou. Eu não conseguia virar a minha cabeça para olhar para a expressão dele. Não conseguia desviar-me da imagem na cabeça de Alice para olhar para ele.
- Eu vou adorá-la qualquer dia, Jazz. E vou ficar muito chateada contigo se não a deixares estar.
Eu ainda estava preso nos pensamentos de Alice. Vi o futuro a chegar enquanto a resolução de Jasper diminuía com o pedido inesperado dela.
- Ah… - Ela suspirou, a decisão dele tinha criado um novo futuro. - Vêem? A Bella não vai dizer nada. Não há nada para nos preocuparmos.
A maneira como ela disse o nome da rapariga… como se já fossem confidentes…
- Alice – Engasguei-me. - O que é que isto…?
- Eu disse-te que estava a aproximar-se uma mudança. Eu não sei, Edward. - Mas ela apertou o queixo e eu conseguia ver que existia mais. Ela estava a tentar não pensar nisso; de repente estava a concentrar-se muito em Jasper, embora ele estivesse demasiado espantado para fazer algum progresso com a sua decisão.
Ela fazia aquilo às vezes, quando me queria esconder alguma coisa.
- O quê, Alice? O que é que estás a esconder?
Ouvi o Emmett a resmungar. Ele ficava sempre frustrado quando a Alice e eu tínhamos aqueles tipos de conversa.
Ela abanou a cabeça, tentando manter-me fora.
- É sobre a rapariga? - Exigi. - É sobre a Bella?
Ela tinha os dentes cerrados a concentrar-se, mas quando eu disse o nome da Bella, ela teve um deslize. Só durou meio segundo, mas foi o suficiente.
- NÃO! - Gritei. Ouvi a cadeira a bater no chão e percebi que estava de pé.
- Edward! - O Carlisle levantou-se também, com o braço dele no meu ombro. Mal me apercebia dele.
- Está a solidificar. - A Alice sussurrou. - A cada minuto que passa tu estás mais decidido. Só existem duas saídas para ela agora. É uma coisa ou outra, Edward.
Eu conseguia ver o que ela via… mas não queria aceitar.
- Não. - Disse outra vez; não havia volume na minha negação. As minhas pernas ficaram bambas e precisei de me apoiar na mesa.
- Alguém por favor deixa que o resto de nós saiba o mistério? - O Emmett reclamou.
- Eu tenho que ir embora. – Sussurrei para a Alice, ignorando-o.
- Edward, nós já falamos sobre isso. - O Emmett disse alto. - Essa é a melhor maneira de fazer a rapariga falar. Além do mais, se tu fores embora, nós não vamos ter certeza se ela vai dizer alguma coisa ou não. Tu tens que ficar e lidar com isso.
- Não te vejo a ir para lugar nenhum, Edward. – Alice disse-me. – Já não sei se te consegues ir embora. - Pensa, acrescentou silenciosamente. Pensa em partir. Eu percebi o que ela queria dizer. Sim, a ideia de nunca mais ver a rapariga era… dolorosa. Mas era também uma necessidade. Eu não conseguia aprovar nenhum dos futuros a que aparentemente eu a tinha condenado.
Não tenho certeza absoluta quanto ao Jasper, Edward. Alice continuou. Se partires, ele vai pensar que ela é um perigo para nós.
- Eu não ouço isso. – Contradisse-a, ainda apenas meio consciente da nossa plateia. O Jasper estava hesitante. Ele não faria alguma coisa que magoasse a Alice.
Não neste momento. Arriscarias a vida dela, deixá-la-ias desprotegida?
-Por que é que me estás a fazer isto? - Gemi. A minha cabeça caiu nas minhas mãos.
Eu não era o protector de Bella. Não podia ser isso. O futuro dividido da Alice não era prova suficiente disso?
Eu também a amo. Ou vou amar. Não é a mesma coisa, mas eu quero-a por perto para isso.
- Também a amas? - Sussurrei, incrédulo.
Ela suspirou. Tu és tão cego, Edward. Não consegues ver a direcção que estás a tomar? Não consegues ver onde é que já estás? É mais inevitável do que o sol nascer a leste. Vê o que eu vejo…
Eu abanei a minha cabeça, horrorizado. - Não. - Tentei bloquear as visões que ela me revelava. - Não tenho que seguir esse caminho. Eu vou-me embora. Eu vou mudar o futuro.
- Podes tentar… - Disse, a sua voz céptica.
- Ah, por favor! - Emmett aumentou o tom de voz.
- Presta atenção. - Rosalie disse-lhe. - A Alice vê-o a apaixonar-se por uma humana! Que clássico do Edward! – Fez um som de vómito.
Eu mal a ouvi.
- O quê? - O Emmett disse, surpreendido. Depois o riso dele como um rugido ecoou pela sala. - É isso o que tem acontecido? - Ele riu-se de novo. – Que má sorte, Edward.
Senti a mão dele no meu ombro, e afastei-a distraidamente. Não lhe conseguia prestar atenção.
- A apaixonar-se por uma humana? - Esme repetiu numa voz impressionada. - Pela rapariga que ele salvou hoje? A apaixonar-se por ela?
- O que é que vês, Alice? Exactamente. - O Jasper pediu.
Ela virou-se para ele. Eu continuei a olhar para a cara, tonto.
- Tudo depende se ele é forte o suficiente ou não. Ou ele a vai com as próprias mãos – Virou-se para encontrar o meu olhar outra vez – o que me ia realmente irritar, Edward, e nem digo sequer o que é que isso te faria sentir – Olhou para o Jasper novamente - Ou ela vai ser uma de nós algum dia.
Alguém engasgou-se com a surpresa, não vi quem foi.
- Isso não vai acontecer! - Estava a gritar de novo. - Nenhum dos dois!
A Alice pareceu não me ter ouvido. - Tudo depende. - Repetiu. - Talvez ele seja só forte o suficiente para não a matar, mas vai ser por pouco. Vai precisar de uma quantidade incrível de controlo. - Meditou. - Mais até do que o Carlisle tem. Talvez ele só seja forte o suficiente… A única coisa para o qual ele não é forte o suficiente é para ficar longe dela. Essa é uma causa perdida.
Não conseguia encontrar a minha voz. Ninguém parecia ser capaz de encontrar a sua. A sala ficou imóvel.
Eu olhei fixamente para a Alice, e todos olharam fixamente para mim. Conseguia ver minha a própria expressão de terror de cinco pontos de vista diferentes.
Depois de um longo momento, o Carlisle suspirou.
- Bom, isto… complica as coisas.
- Eu que o diga. - O Emmett concordou. A voz dele ainda estava perto da gargalhada. Podia contar sempre com o Emmett para encontrar a piada na destruição da minha vida.
- Mas suponho que o plano continua o mesmo. - O Carlisle disse, a ponderar. - Vamos ficar e observar. Obviamente, ninguém irá… magoar a rapariga.
Enrijeci.
- Não. - O Jasper disse calmamente. – Posso concordar com isso. Se a Alice só vê duas saídas…
- Não! - A minha voz não era um grito ou um rosnado ou um choro de desespero, mas uma combinação dos três. - Não!
Eu tinha que ir embora, ficar longe do som dos pensamentos deles - da aversão egoísta de Rosalie, do humor de Emmett, da paciência infinita de Carlisle…
Pior: a confiança de Alice. A confiança de Jasper na confiança dela.
Pior de tudo: a… alegria de Esme.
Saí da sala. A Esme tocou no meu braço quando eu passei, mas eu não respondi o gesto.
Estava a correr antes de estar fora da casa. Passei pelo rio num salto, e corri para a floresta. A chuva tinha voltado, caindo tão pesada que me ensopei em poucos segundos. Gostei da água espessa - criou uma parede entre mim e o resto do mundo. Rodeou-me, deixou-me isolado.
Corri para este, sobre e pelas montanhas, sem me desviar da linha do meu curso, até que consegui ver as luzes de Seattle do outro lado da baía. Parei antes que chegasse à fronteira da civilização.
Cercado pela chuva, sozinho, finalmente obriguei-me a ver o que tinha feito - como tinha mutilado o futuro.
Primeiro, a visão de Alice e da rapariga com seus braços à volta uma da outra - a confiança e amizade eram tão óbvias que gritavam da imagem. Os olhos castanhos expressivos da Bella não estavam confusos naquela visão, e sim cheios de segredos - nesse momento, pareciam segredos felizes. Ela não se afastou do braço frio de Alice.
O que é que aquilo significava? Quanto é que ela sabia? Naquela visão congelada do futuro, o que é que ela pensava de mim?
Então a outra imagem, tão parecida, só que colorida com horror. A Alice e Bella, os seus braços ainda à volta uma da outra na sua amizade confiável. Mas agora não havia diferença entre esses braços - os dois eram braços macios e de mármore, duros como aço. Os olhos atentos de Bella já não eram castanhos chocolate. As suas íris eram de um vermelho vívido, chocante. Os segredos neles eram inatingíveis - aceitação ou angústia? Era impossível de dizer. O rosto dela era frio e imortal.
Tremi. Eu não conseguia evitar as perguntas parecidas, mas diferentes: O que é que aquilo significava? Como é que aconteceu? E o que é que ela pensava de mim agora?
Eu podia responder àquela última. Se eu a forçasse a fazer parte desta meia vida vazia por causa da minha fraqueza e egoísmo, com certeza ela iria odiar-me.
Mas havia mais uma imagem horrorosa - pior do que qualquer outra que já tivesse retido na minha cabeça.
Os meus próprios olhos, de vermelho, intensos com o sangue humano, os olhos de um monstro. O corpo da Bella nos meus braços, branco pálido, vazio, sem vida. Era tão concreta, tão clara.
Não suportava ver aquilo. Não conseguia suportar. Tentei tirá-la da minha mente, tentei ver outra coisa, qualquer coisa. Tentei ver a expressão no rosto dela com vida que tinha obstruído a minha visão no último capítulo da minha existência. Tudo em vão.
A visão negra da Alice encheu a minha cabeça, e eu contorci-me internamente com a agonia que me causou. Enquanto isso, o monstro dentro de mim estava cheio de felicidade, eufórico com as hipóteses do seu sucesso. Deixou-me enjoado.
Aquilo não podia ser permitido. Tinha que haver uma maneira de mudar o futuro. Eu não ia deixar que as visões de Alice me dissessem o que fazer. Eu ia escolher um caminho diferente. Existia sempre uma escolha.
Tinha que existir.

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